Por: Geani Paula de Souza/Comunicação Assesoar

O contexto da pandemia de covid-19, a partir de 2020, e com o agravamento da crise econômica e o desemprego em alta, fizeram muitas famílias ficarem em situação de vulnerabilidade social, onde tiveram que optar entre pagar aluguel ou comprar comida. Assim, surgiu a ocupação Marielle Franco, no município de Palmas, região sudoeste do Paraná, que diante da difícil escolha entre as despesas de moradia e alimentação, optaram pela ocupação de um imóvel abandonado com cerca de 25.000 m², que não cumpria sua função social, no bairro Alto da Glória.

A ocupação iniciou em 24 de janeiro de 2021, e se deu, em razão da necessidade das famílias, com vistas a tentar algum tipo de provisão do poder público que lhes assegurasse o direito à moradia.

“Vivemos em uma sociedade capitalista que exclui os trabalhadores, e quanto mais empobrecido esse trabalhador é, mas excluído esse trabalhador fica, ao invés de ser acolhido e as políticas públicas darem suporte, acontece ao contrário, porque essa é a forma do capitalismo nos tratar”, comenta Cristiane Katzer, da coordenação do Fórum Regional das Organizações do Sudoeste do Paraná.

Em meio a tantas dificuldades, um princípio que rege as organizações populares uniu campo e cidade para fortalecer a luta e a resistência das famílias. Desde os primeiros dias de formação da comunidade, as famílias contaram com ações de solidariedade e mobilização em unidade com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o Fórum Regional das Organizações Populares do Campo e da Cidade do Sudoeste do Paraná, a articulação Despejo Zero e o Instituto Democracia Popular (IDP) e a Rede Nacional de Advogados e Advogadas Populares (Renap).

Cleia da Luz Rezer, uma das coordenadoras e moradora da comunidade, conta como era o tratamento no início. “Nós eramos chamados de loucos por estar aqui, um dia fui na secretaria de assistência social fazer um cadastro, e me disseram porque eu estava aqui, que estava louca”, comenta Rezer.

Nesses três anos, muitas batalhas foram travadas, na luta por moradia, mas também pela dignidade das famílias. “Um dia frio, e nós não tinha água nem pra fazer um café de manhã, saímos sem comer, sem café e fomos na promotoria pedir para colocar água pra nós, depois disso eles vieram e colocaram cinco relógios”, disse Cleia, que hoje se emociona ao contar.

O caso foi levado à Comissão de Soluções Fundiárias do Tribunal de Justiça do Paraná, que visitou o local em março de 2022, e após diversas audiências de conciliação, foi construída a solução. Nos termos do Decreto n°: 4.257, de 11 de dezembro de 2023, o referido imóvel foi declarado pelo Prefeito Municipal de Palmas como de utilidade pública para fins de desapropriação, e o mesmo foi destinado para regularização fundiária.

“Não correr o risco de ser despejado e poder dormir tranquilo, é uma vitória imensa, mas ainda tem muitas batalhas que as famílias precisam construir, organizar uma comunidade bonita, com convivência, isso que já tem feito até aqui, não pode se perder”, destaca Bruna Zimpel, da direção nacional do MST.

Vitória dos trabalhadores e trabalhadoras organizados

No dia 02 de março, a comunidade se reuniu em um Ato Político em comemoração pela conquista da comunidade Marielle Franco, em um momento de muitas alegrias, histórias e também de relembrar e festejar essa vitória dos trabalhadores e trabalhadoras.

Compuseram a mesa do ato político Cleia Rezer, da coordenação da ocupação; Paulo Bannake, vereador; Marcelo Zwieker, diretor do departamento de administração fundiária, representando o prefeito municipal; Luciana Rafagnin, deputada estadual; Cristiane Katzer, representando o Fórum Regional das Organizações e Movimentos Populares do Campo e da Cidade do sudoeste do Paraná; Bruna Zimpel, Direção Nacional do MST; Líbina da Silva Rocha, presidente do Instituto democracia Popular, além de diversos amigos e apoiadores da ocupação.

O encontro também foi de homenagens a Marielle Franco, relembrando seu legado e os seis anos do seu assassinato, que se completam no dia 14/03. “Quando a gente fala que a luta não é isolada, e o que nós fazemos aqui reverbera em outros espaços, é o significado da luta de Marielle Franco, pois a luta e a história dela chegou até nós, chegou pelo que ela representa e pelo o que ela é em nossa luta”, comenta Cristiane Katzer.

O dia foi marcado pelo sorriso e o choro de felicidade das famílias, que fizeram muita luta e resistência para poder chegar até aqui. Emily Paz, jovem de 17 anos, filha de uma das moradoras, comenta o seu sentimento quando chegou na ocupação e a felicidade de poder ter um lar com dignidade hoje.

“No momento que viemos pra cá, ou era isso, ou não tínhamos pra onde ir, e chegando aqui eu vi que não era só nós, que tinham várias famílias na mesma situação. Mas o que foi mais forte pra mim, foi o preconceito da sociedade, e eu sentia um pouco de medo em dizer que era da ocupação, mas hoje eu sinto muito orgulho em dizer que sou da comunidade Marielle Franco”, diz.

A comunidade é composta por mais de 80 famílias, que irão poder ter uma moradia digna, mas que precisam continuar unidas na luta pelo desenvolvimento da comunidade e avanço em demandas básicas, como acesso à estrada, energia elétrica, água e saneamento básico.

“Todo esse sofrimento hoje valeu a pena, o sentimento é de gratidão e de muitas felicidades sabendo que nós podemos permanecer, mas precisamos continuar lutando”, disse Cleia Rezer.

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